Olivença
Portugal a conquistou aos Mouros
( CRER E QUERER PARA VENCER )
Quando os Templários portugueses em 1228 trouxeram Olivença, por conquista aos Mouros, para convívio lusitano, estava bem longe de admitir que esse território se tornaria, a trecho, ponto de divergência diplomática capaz de impedir o natural reconhecimento de limites por parte do Estado português numa questão que a Comissão de Limites Luso-Castelhana, reunida em Lisboa em 1952, deixou em aberto "para que seja resolvida amigavelmente pelos dois países".
É já longa a história do diferendo, durante os 194 anos que ele dura, e a sua exacta configuração nem sempre é conhecida dos políticos que têm constituído os governos dos dois. países da Península. Talvez porque o termo e a vila de Olivença são uma região com fraco significado económico e já não contém valor estratégico reconhecido, Portugal não o tem reclamado pelo que, ao invés do que ocorre com Gibraltar, tem vindo o decair no mais completo, rotineiro e cómodo esquecimento oficial.
Mas para quem esse esquecimento não se oficializa é para o Grupo dos Amigos de Olivença que esta semana celebra meio século de existência, como agremiação, com uma entusiástica actividade em prol da recuperação dos seiscentos quilómetros quadrados de ex-Alentejo.
Para eles o histórico diferendo é uma questão linear e não tem segredos. Conhecem todos os minutos de vida da região desde a sua inclusão na Coroa por conquista e sua incorporação por via dos tratados, dos quais não ignoram um único artigo que seja. A perda de Olivença, na súbita invasão franco-espanhola na campanha de 1801, que mereceu a mavórtica denominação de "Guerra das Laranjas", a qual retira ao acto guerreiro todo o carácter belicista do recontro, mais a não entrega do território que o Tratado de Viena consagrou, em 1815, fazem da região oliventina o motivo para uma grande mágoa nacional e a razão de ser do Grupo dos Amigos de Olivença.
Há cinquenta anos nascia o movimento que abria de novo uma porta à secular existência da retrocessão incondicional desse território perdido, acção que desde logo cativou o segmento dos irredentistas portugueses. Como o seu aparecimento na ribalta do contencioso não foi de geração espontânea, resta procurar as raízes na pré-história do grupo.
Em plena guerra civil de Espanha. corria o ano de l937, o memorial dos Restauradores foi pela primeira vez nesse, l.° de Dezembro, alvo de particular tipo de decoração feita em cartazes cujas legendas saudavam Olivença como território português administrado por Espanha.
Em torno deste acontecimento cresceu um movimento de opinião com o fim de contrariar a ideia de que Olivença não era portuguesa. No Porto, o Prof. Eleutério Cerdeira, Manuel Rodrigues da Conceição, Comandante Cameira e Veríssimo Alves Moreira encabeçavam a campanha enquanto em Lisboa o oliventino Ventura Ledesma Abrantes agitava outro grupo de irreverentes.
A tradicional aposição de um dístico "Saudemos Olivença" no monumento dos Restauradores na data que os consagra, passou a ser legal no dia em que Ventura Abrantes e o então tenente-aviador Humberto Delgado solicitaram autorização oficial para o fazer: As personalidades que os secundavam nesse acto eram, invariavelmente. Francisco Velez Conchincha, Jacinto Fernandes Palma e o engenheiro João Roma.
O movimento ganhou novos aderentes, elementos interessados na divulgação da questão oliventina, uma causa pela qual se haviam já batido. muito particularmente, o duque de Palmela, Solano Constâncio e Estácio da Veiga, no século passado.
Em 1914. o deputado Ramos da Costa fez uma dura interpelação ao governo de então sobre a necessidade de ser reivindicada Olivença, o que levaria mais tarde Afonso Costa, presente no Tratado de Paz de Versailles, a pedir ao diplomata Teixeira Sampaio que lhe organizasse um dossier para colocar aos conferentes, no qual se forçava a linha-mestra do contencioso. Também Bernardino Machado se insurgiu em plena Assembleia contra a passividade com que os governos tratavam a questão.
Tão afincado amor por uma nesga de terra levou a que em 15 de Agosto se fundasse a Sociedade Pró-Olivença projecto reinvidicativo a que se juntaram Octávio Rodrigues de Campos, Flório José de Oliveira, Virgílio Baião, Rodolfo Santa Roxo, Atalaião, Rui de Andrade, capitão Passos e Sousa, Amadeu Rodrigues Pires, Francisco de Sousa Lamy, Odorico Simões e Saul Horácio Ventura, sendo impossível referir todos os que então se sentiram atraídos pela questão que envolve umas centenas de quilómetros quadrados e que, corre tese, não se troca por nada.
Fixou-se sede na Rua Victor Cordon, n.° 31 2.°.
Por essa altura a imprensa veiculou as pretensões da sociedade em artigos que o Dr. Hipólito Raposo subscreveu.
Essa primeira agremiação nunca viria a ser legalizada e terminou a actividade ao fim de pouco tempo.
A maioria dos associados reunia-se regularmente em almoços no Hotel das Nações. Assim, Olivença continuou a ser tema de conversa e de preocupação.
Foi exactamente num almoço da Rua do Arco do Bandeira. que reunia tanto situacionistas como opositores ao regime, que nasceu de novo a ideia de criar um grupo de pressão que, rejeitando processos violentos sensibilizasse os governantes para a necessidade e por ser hora de se tomar uma posição sobre o conflito que se arrastava.
Foi em 2l de Novembro de l945, pelas 14 horas que tomaram posse os elementos que constituíram a Comissão Directiva do recém-criado "Grupo dos Amigos de Olivença".
Tomada como sede provisória a Casa do Alentejo, elaboraram-se os estatutos e procedeu-se à legalização da instituição.
Era então governador civil de Lisboa o capitão de Mar e Guerra Nuno de Brion, A 19 de Outubro de l946 foi-lhe feita a entrega do requerimento e dos estatutos. A Direcção Administrativa Política e Civil do Ministério do Interior apreciou-os. Subiram à Secretaria da Presidência do Concelho e entraram em ciclo-vicioso do qual jamais sairia a desejada legalização.
Salazar nunca permitiu a aprovação dos estatutos embora, com uma certa "frieza cavalheiresca", tolerasse a actividade da associação mas com algumas reservas. Santos Costa foi pior. Enquanto ministro da Defesa, militar que ele soubesse pertencer aos "Amigos de Olivença" passava-o compulsivamente à reserva.
A linguagem anticolonialista dos elementos do grupo, alertando para o facto de haver uma colónia na Europa, administrada pela Espanha, assustou Salazar. Aceitar as razões do grupo significava um risco que não queria correr uma vez que punha em perigo a sua política colonial. A denúncia de uma situação de colonização com repressão cultural e linguística à mistura era factor de incomodidade para o Estado Novo. Pois essa denúncia foi sempre feita pelos " Amigos de Olivença". O presidente do Conselho criou um ambiente de isolamento em torno do grupo que continuou a desenvolver uma intensa actividade para a formação de uma consciência nacional sobre a questão oliventina embora reconhecendo que as perspectivas políticas para resolução do conflito eram pouco animadoras.
Depois de anos de disputa pela sua existência, a posição intransigente dos associados enfraqueceu pelo cansaço e pela idade da maioria dos elementos ficando a actividade do grupo reduzida ao simbólico colocar de flores no monumento dos Restauradores em cada 1.º de Dezembro. A chama da reivindicação empalideceu mas não se extinguiu.
Pela sua direcção nessa primeira fase da vida do grupo passaram nomes como os de Ventura Abrantes, Prof. Queirós Veloso, duque de Palmela, Ramos e Costa, Hemâni Cidade, Paulo Caratão Soromenho e tantas figuras da intelectualidade portuguesa. Serviram-no homens como Humberto Delgado, Matos Sequeira, Sidónio Muralha, conde de Almada, Veiga de Macedo, João Pereira da Rosa, Tomé Feteira, Moses Amzalack e tantos outros e mais proximamente Mascarenhas Barreto, Em 1994 reiniciaram-se as actividades sendo fortemente impulsionadas pelo conhecimento de existir um projecto de reconstrução da Ponte da Ajuda. A Comissão de Limites (do Ministério dos Negócios Estrangeiros) e personalidades do governo foram contactados por elementos directivos no sentido de se dever assumir na globalidade a despesa da reconstrução da ponte a fim de que não se extingam os argumentos para reinvidicar a praça.
Foi uma oportunidade mais para ampla divulgação do contencioso fronteiriço. A Faculdade de Direito de Lisboa, sensibilizada pela questão, correspondeu com a organização de um debate que focou o aspecto jurídico da questão de Olivença apreciando os tratados à luz do Direito Internacional. Nos seus cinquenta anos de existência o Grupo dos Amigos de Olivença tem como metas conseguir sede própria a fim de dar corpo ao projecto de criação de um Centro de Estudos Oliventinos. Prosseguir, exigindo que os mapas oficiais de Portugal continuem a configurar a irregularidade de Olivença. Encorajar as entidades oficiais, políticos e govemantes a adoptar uma posição de firmeza em relação à anexação daquele território, há 194 anos administrado por Espanha. | |